Durante a próxima semana os professores, presumivelmente descontentes com a política do patrão ministério, vão fazer greve durante dois dias. Muitos farão, portanto, aquilo que mais gostam: não dar aulas.
Não faltam motivos que possam explicar esta lamentável situação: ou estão cansados de aturar alunos indisciplinados e desinteressados, ou julgam-se impotentes, desautorizados, descrentes e desmotivados, ou não sabem ensinar. Porque para ensinar, como disse Eça de Queiróz, é preciso saber. E muitos dos professores que têm menos de 40 anos, sabem pouco, sabem muito menos do que deveriam saber. Saber pouco não os impediu de duas portuguesas proezas : a licenciatura e a admissão ao sistema de ensino. O culto da falta de exigência e da cabulice, o desdém pela aprendizagem, o desprezo da língua portuguesa e da história de Portugal, começam no ensino primário, enraízam-se no ensino secundário e até já invadiram as universidades públicas.
O ensino pós 25 de Abril, que recebe parte de leão dos orçamentos do Estado, que recebe milhões e milhões dos fundos comunitários, que tem nadado em dinheiro para renovação de instalações e equipamentos e pagamento de salários, tem-se permitido fabricar, sem remorsos, milhares de ignorantes licenciados, areia para os olhos das estatísticas que ocultam e deformam a realidade.
Estes, contentes com o canudo que encanta a família e ignorantes da sua ignorância, acham-se detentores do direito natural de rapidamente adquirirem estabilidade profissional patrocinada pelo Estado. Para nosso mal, para ofensa das nossas contribuições fiscais e penalização das contas públicas, esta multidão mal preparada e arrogante tem conseguido levar a água ao seu moinho. É certo que todos anos têm o incómodo burocrático da renovação da candidatura, é certo que arriscam zangar-se com a geografia da escola onde são colocados, mas, longe ou perto de casa, são admitidos e são pagos pelo ministério.
Para mim, que nunca ensinei, que tenho tido a felicidade de não ter a necessidade de candidatar-me ao ensino, a situação dos professores é o mais grave problema do País, tão decisivo que sem a sua solução, qualquer melhoria obtida em qualquer outro departamento de Estado, será sempre atenuada, minorada, minada, pela persistência do devorador tumor que é o ensino público.
Não está em causa, evidentemente, a utilidade da profissão: é tão axiomática que dispensa justificação. Em primeiro lugar, está em causa a quantidade de professores. Segundo a novinha em folha BDAP, dos cerca de 576.000 funcionários pertencentes à Administração Central, 205.000 estão ao serviço do ministério da Educação, sendo mais de 160.000 destas pessoas, mulheres. Arredondando, 1 em cada 3 funcionários públicos é professor. Evito outros números, como o da evolução das despesas com pessoal em percentagem do Produto Interno Bruto, para poupar quem lê a desconfortáveis arrepios. Deixo a pergunta: é realmente indispensável e inevitável que o Estado seja o gestor de milhares de escolas ? Ou será este carissímo e ineficaz encargo o resultado de um dogma que pouco se discute e que medrosamente os partidos do poder evitam reformar. Não é preciso ser técnico do ministério das Finanças para saber que o saneamento e a saúde das contas do Estado exigem, para ser coisa duradoura e fiável, não a redução dos investimentos públicos, não apenas o sucesso do combate à evasão fiscal, mas exigem, sobretudo, a redução efectiva das gigantescas despesas com pessoal. Não se trata de despedir ou dispensar os professores: trata-se da urgência de privatizar o ensino primário e liceal. Não faltam pessoas e não faltam organizações capazes de gerir o ensino. Falta bom senso, competência e firmeza governativas. Faltam a inteligência e a dignidade de se preferir trabalhar pensando no médio e no longo prazo à pequenez de apenas gerir o dia-a-dia para ganhar as próximas eleições.