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sexta-feira, 31 de agosto de 2007

A mana

A minha irmã é uma menina com o coração na boca, dada a nervosismos precipitados Hoje, a mana indignou-se na via pública ao assistir à passagem de uma caravana de viaturas oficiais no infeliz Terreiro do Paço. A mana acha indecente que os membros do governo, criaturas que juraram publicamente respeitar e fazer observar as leis, participem e beneficiem dos atropelos ao código da estrada que polícias e seguranças cometem diarimente nas ruas de Lisboa e nas estradas de Portugal. A mana, que já tem o bom senso de não participar nas eleições, ainda não compreende que os membros do governo, coitados, tão mal pagos, tão assoberbados de despachos, reuniões e relatórios, tão criticados nos corredores departamentais e nos transportes públicos, tão expostos ao ridículo nos jornais, tão empequenecidos com os erros das suas decisões, tão conscientes das suas incapacidades, tenham ao menos a consolação de se deslocarem em Lisboa sem paragens nas passadeiras e nos sinais. Podem engavetar promessas, mas não podem chegar atrasados.

33

33 and counting. E a ciência continua a não descobrir a maneira de prolongar a juventude, de adiar o envelhecimento: uma imensa desgraça, apenas atenuada pela cara de menino, que me há-de valer, quando chegar aos 60, ouvir pessoas a darem-me 40 e não as desmentir.
Como de costume, para me poupar à humilhação das recusas e das ausências inesperadas, não reuni os amigos. O jantar da praxe com os meus pais e as sms da praxe das amigas com boa memória. Algumas excederam-se e cometeram a injustiça de me mimarem com prendinhas que adoro receber: para fazer inveja, e em jeito de agradecimento e homenagem, aqui vai o rol: a Ju fez-me chegar pelo correio a Bíblia, que se não me consolar, irá instruir-me; a Filipa ganhou o direito de me beijar o pescoço durante 3 minutos sempre que me vaporizar com o YSL; a Eva teve a ideia de mandar estampar numa t-shirt um dos seus poemas, explícito, erótico, impublicável, que ainda reforçou com um Armani que promete não deixar nariz algum indiferente; e a Ana, com faro de arqueóloga ou de detective, aumentou-me a livraria com a biografia do espantoso Jorge Jardim. Maravilhosas prendinhas!

sábado, 18 de agosto de 2007

Madame de Stael

Madame de Stael (1766-1817) precisava de amor como de oxigénio. Acumulou amantes, que deslumbrava com a sua inteligência e independência, e que esgotava com as suas insaciáveis exigências sentimentais. Sensata gestora da herança do pai, apesar da generosidade para com os amigos e do luxo em que vivia; sensata defensora da monarquia constitucional, em época de ferozes convulsões; proibida de viver em Paris pelo megalómano Napoleão, altiva desdenhadora de convenções, hospitaleira com quem partilhava afinidades e gostos, escritora de sucesso, manteve durante anos tertúlias que fizeram fama em toda a Europa. O casamento não lhe transtornou a vida, porque entre Deus e o amor não reconheço nenhum mediador a não ser a minha consciência: o marido "não me fará infeliz, pela simples razão de que não pode contribuir para a minha felicidade".
A quem quiser saber mais sobre a vida desta ditosa senhora, recomendo a leitura do texto de Fátima Bonifácio, As vidas desencontradas do duque de Palmela e de Mme de Stael, compilado no livro Estudos de História Contemporânea de Portugal, ICS, 2007.

Crime em directo

Ontem, perto de Silves, cerca de 100 fanáticos que são um insulto à inteligência da espécie humana, entraram num terreno agrícola e destruíram uma plantação de milho transgénico. A GNR não foi capaz de correr com os invasores à bastonada, algumas estações de rádio fizeram aos criminosos o favor de lhes conceder tempo de antena, e os jornais chamam "activistas" a quem desrespeita a propriedade privada.

De Jerusalém

Preguiçava numa aldeia inundada de emigrantes que não sabem falar português, quando recebi de Jerusalém uma mensagem da Juliana a alegrar-me e consolar-me: "Já deixei o pedido no muro das lamentações.Vais ser abençoado, tenho a certeza!" Deus te ouça, estimada menina.

sábado, 11 de agosto de 2007

Ferro

Um intelectual de acção, um jornalista que sabia escrever e pensar, um cosmopolita que criou uma propaganda séria, que não precisava de ofender e mentir, António Ferro, escreveu a Salazar a carta que se segue:
27-11-934
Exmo. Sr. Dr. Oliveira Salazar
Como V. Ex.ª tem estado ocupadíssimo com assuntos duma importância vital para os interesses da Nação e do Estado Novo, não tenho insistido para que V. Ex.ª me receba. A mais de quinze dias, porém, da minha chegada a Lisboa começo a sentir a necessidade moral, urgente, de lhe explicar o que fiz, ou tentei fazer, durante a minha recente viagem e de receber de V. Ex.ª aquelas indispensáveis directrizes para o andamento de certas questões cuja resolução se torna urgente.
A estas razões de ordem oficial ou burocrática, junta-se ainda - perdoe-me V. Ex.ª esta nota sentimental - o desejo de o ver, de lhe falar, depois duma longa ausência.
Aguardando as ordens de V. Ex.ª creia-me sempre seu amigo dedicado e seu incondicional servidor
António Ferro
ANTT/AOS/CP - 112, fls. 236/237

Ai Timor

Em Timor continuam as complicações políticas e continua adiada a paz: o antigo herói nacional Xanana Gusmão foi indigitado primeiro-ministro de um governo de coligação. A Fretilin, excluída do Poder, apesar de ter sido o partido mais votado nas recentes eleições, não aceita o governo "ilegal" e os seus apoiantes vieram para a rua protestar à velha maneira selvagem: queimaram casas, invadiram um orfanato e violaram crianças.
Timor não tem capacidade para ser independente, e só os militares e polícias em missão das Nações Unidas impedem nova guerra civil.

terça-feira, 7 de agosto de 2007

Macário

Acabo de ler que Marques Mendes escolheu para porta-voz Macário Correia. Imagino o congresso do PSD: as pessoas a fingir que ouvem com atenção os discursos da praxe, a baterem palmas forçadas, a atirarem moeda ao ar para decidir o voto, a rezarem por uma aparição na TV e a suspirarem por um intervalo para os cigarros e para o descanso dos neurónios intoxicados de tanto palavreado, coitados. E os congressitas fumam, cavaqueiam, piadas e confidências, palpites e projectos, e de repente, rodeado de jornalistas de microfone em punho, o cruzado Macário, o presidente Macário que disse que beijar uma rapariga que fuma é como lamber um cinzeiro, o ecologista Macário que talvez tenha feito as duas coisas e agora talvez não faça nenhuma de tão ocupado com o partido e a câmara de Tavira, a declarar aos fabricantes de notícias que há-de ser o candidato a líder no congresso de 2069, ainda cheio de saúde porque não fuma e vai de bicicleta para a praia.

domingo, 5 de agosto de 2007

Baratas

Eu sou quase inofensivo: evito pisar formigas, aborrece-me esmagar caracóis, recuso pescarias e caçadas, os cães derretem-se comigo, as vaquinhas encantam-me, e as meninas que se cansam de mim não me ouvem insultos. Mas as baratas são um caso especial. Os vermes usam-se em tratamentos médicos, mas as baratas são simplesmente imprestáveis e nojentas. Elimináveis. Por isso, conseguem despertar-me o impulso homicida. Eu a ser arrastado pelo meu intratável cão que nunca se recusa a ir à rua e as sacanas a passearem-se no passeio. Como um menino prevenido vale por dois, para evitar que me entrem em casa, me invadam o quarto, horrorizem mãe e visitas, peguei numa cana e esmaguei duas. Humano, demasiado humano: qualquer pessoa razoável, imune a fanatismos budistas, faria o mesmo, tanto mais que a moralizante Quercus nunca convocou os jornalistas para opinar sobre as baratas urbanas.

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

18

Uma senhora professora acaba de me contar que hoje foi ao funeral de um aluno. Tinha 18 anos e adormeceu ao volante. Embora a irresponsabilidade e o sono inoportuno abundem em qualquer idade, dou por mim a pensar que a maioridade aos 18 é um favor aberrante, uma concessão prematura e desajustada à geração que corre.