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quinta-feira, 30 de novembro de 2006

Borat

O filme que está a causar polémica. As autoridades russas não apreciaram o excesso de gozo e sentiram-se ofendidas: o filme foi censurado na terra de Putin. Talvez o veja: parece cheio de belezas americanas.

quarta-feira, 29 de novembro de 2006

Vem aí o referendo da treta

O senhor Presidente da República acaba de anunciar a data da realização do referendo sobre o aborto, que a linguagem hipócrita do politicamente correcto suavizou para interrupção voluntária da gravidez. Ou seja, 2007 vai começar mal. A perniciosa extrema esquerda - um dia terei pachorra para sem sucesso requerer a ilegalização dos partidos que sonham com a ditadura do proletarido - e as fossilizadas associações feministas, vão durante algumas semanas intoxicar o País de disparates e absurdos: que as mulheres é que mandam nos seus corpos, que as mulheres têm o direito de não quererem dar à luz e não têm o dever de suportar os fardos da maternidade, que as liberdades individuais exigem o direito ao homícidio de coisinhas minúsculas em gestação. Isto não admira porque a extrema esquerda sempre apreciou massacres, fuzilamentos, campos de concentração; e porque entre a juventude defensora do aborto, imperam os ignorantes, que aceitam bovinamente as enormidades que lhes pregam com o cheirinho sedutor da legitimidade da revolta e dos sagrados direitos individuais.
Porém, como não faltam pessoas que genuínamente acreditam na dignidade da vida humana e que acreditam na importância da responsabilidade individual, que reconhecem e entendem que defender a vida é um imperativo ético de dimensão civilizacional que não deve permitir que as senhoras que engravidam abortem, os defensores da morte, os envenenadores da colectividade que se fazem passar por liberais e modernos, terão a necessária oposição.
O decoro, o bom senso, a gratidão para com quem nos deu a vida, determinam que se seja contra a morte de vidas indefesas. A violação constante da lei não a invalida, antes obriga ao reforço da educação, da vigilância e da repressão. E se muitos abortos ilegais têm sido feitos impunemente, quantos abortos não se evitaram por ser proibido o aborto ?

Breve relato de um dia bem passado

Tive um dia proveitoso. Alimentar o espírito, esclarecer assuntos administrativos, passear por Lisboa. Para provocar alguma inveja, aí vai o resumo das actividades:

10.30-13 h : Instituto de Ciências Sociais - aproveitei os descontos de 50%, para uma proveitosa compra de vários números da revista Análise Social e de livros editados pelo ICS. Na biblioteca, alegrar-me com a eficiência e a simpatia da Marisa, seleccionar e reproduzir alguns textos de Marcello Caetano, a editar em 2007;

14.oo-14.30 h : Frustrada tentativa de acertar o arrendamento de um imóvel: os escritórios da empresa imobiliária estavam estranhamente vazios;

15.00- 16.00 h - Visita à livraria Bucholz, uma das melhores de Lisboa, sempre cheia de livros estrangeiros. Se o livro que deseja foi publicado em Adis Abeba, a Bucholz encomenda-o da Etiópia. Como esperava, não resisti aos livros da Bucholz e, entre outros, trouxe um estudo sobre o corporativismo português feito por um historiador brasileiro;

16.00-16.30 h - Lanche e vagarosa descida da Avenida da Liberdade. Lojas que não são para o meu fraco bolso: um fabuloso sobretudo da Hugo Boss a 500 euros, estrangeiros para cima e para baixo, vistosas portuguesas muito bem vestidas;

17.00-17.40 - Visita ao atendimento geral da Inspecção Geral das Actividades Culturais no Palácio da Independência. Porque havia fila e apenas dois funcionários, e o vigilante, um simpático e matulão moreno, me despertou a curiosidade, dei um pulo a uma sex shop vizinha. O mau gosto do vermelho e do plástico, os reformados e a oferta do costume: objectos de todos os tamanhos para pessoas solitárias, roupa interior capaz de transtornar um jesuíta, revistas e filmes para todos os gostos. Pela primeira vez na vida fechei-me numa cabine e introduzi 2 euros na ranhura. O ecrã destapou-se e apareceu uma moça, morena e magra, a contorcer-se numa cama redonda, tocando-se e fazendo caretas. Observei-a com atenção e, como esperava, sem excitação: parecia enfadada e saturada do seu ofício, e não era moça de fazer parar o trânsito. Foram 3 minutos que valeram pela absoluta novidade da experiência e pela confirmação desta minha ideia: a nudez apetecível é aquela que é por nós provocada, agentes e não espectadores.
De volta ao IGAC, conheci o Pedro, que me atendeu, também formado em História e que também já elaborou uma Portaria de gestão documental. Simpatizámos e disse-me o Pedro que o registo das obras não é obrigatório - custa 25 euros - mas é muito conveniente juridicamente. Era o que precisava saber, Pedro.

Fim

Aimer

N´oubliez pas: jamais aimer.

terça-feira, 28 de novembro de 2006

Prada

A vida, já se sabe, reserva-nos surpresas, coisas que acontecem inesperadamente. Eu tinha por certo que jamais sucumbiria ao desnorte consumista. Enganei-me. Hoje entrei numa loja que comercializa óculos, com a intenção de comprar sem me exceder. Escolhi um par a um preço aceitável. Depois, a venenosa e competente funcionária, cometeu a vileza de me dar a provar uns óculos Prada. Senti-me como quando uma mulher intelectual e fisicamente avassaladora nos devasta ao fim de uma hora de conversa, e rendi-me: aqueles óculos magníficos que custavam uma obscenidade tinham que ser meus. E como os óculos não dizem não me toque, não dizem não seja tonto, comprei-os. Eu com Prada, parece mentira.

Poupar

Cara leitora ( gosto de imaginar que sou lido por meninas e senhoras) : não se esqueça de poupar, pelo menos, 20% do seu salário. O futuro exige-o; e a incompetência do Estado, viciado em despesas inúteis que a todos prejudicam, recomenda-o.

segunda-feira, 27 de novembro de 2006

Uma mentira deliciosa

Ontem uma menina de 30 anos, professora que me parece atípica porque muito culta e cerebral, de quem me considero amigo, apesar da falta de oportunidades para testemunhar a amizade - não vos vemos há 3 anos apesar da comunicação regular pela internet - deixou-me um comentário no Hi 5. Porque sou um bocadinho vaidoso e porque o que ela escreveu é o exemplo perfeito da mentira animadora e embaraçante, aí vai:

Como é possivel este senhor não ter ainda um comentário ao seu perfil?! Fica a pergunta retórica e um beijo para uma pessoa que a uma elevadíssima dose de inteligência e de ciência soma sensibilidade, perspicácia e generosidade.

Por isso, quando dizemos que não gostamos de mentiras, quando nos zangamos ao descobrirmos que nos mentem, não estamos a ser absolutamente sinceros e coerentes. Mais, mentimos, porque há mentiras que deliciam, como a transcrita.

domingo, 26 de novembro de 2006

O nilista

Portugal tem a felicidade de ter um nilista em plena e fecunda actividade. O nilista é o senhor Vasco Pulido Valente. Historiador de qualidade, a sua obra O poder e o povo é um exaustivo e muitíssimo bem documentado estudo sobre a implantação da República. É absolutamente imperdível porque à erudição junta o esmerado português, raro entre os enfadonhos profissionais da História.
VPV é também cronista original e temido. Hoje, no Público, VPV escreve sobre Portugal à chuva . A tese de VPV, necessariamente sintética, superficial e contundente dada a natureza lacónica das suas crónicas, é a seguinte: as chuvadas inundaram Portugal porque Portugal é um país estrutural e irremediavelmente atrasado e miserável, que sempre falhou o encontro com a modernidade. As directivas e os rios de milhões da União Europeia permitiram pintar a fachada mas não mudaram as fundações de Portugal, que "é de ponta a ponta uma improvisação" e a "história da democracia portuguesa, que estranhamente se imagina europeia, tem sido uma comédia de erros."
VPV tem razão: o Estado português, que VPV já serviu como secretário de Estado da Cultura e como deputado, o Estado Português que paga um salário a VPV pelas suas brilhantes investigações académicas no ICS, é, não obstante o trabalho de algumas pessoas muito qualificadas e bem intencionadas, uma incompetente e voraz máquina burocrática. Não haja ilusões: com estes demagógicos e medíocres partidos, que assaltaram, ocuparam e lesaram o Estado, não há reforma possível. Um dia, os militares e as elites empresariais perceberão isto, acordarão da sua letargia, e actuarão em conformidade.

Sabedoria portuguesa IV

"O amor é um desmesurado desejo de amizade."

Mário Cesariny

Cesariny

O Governo pode não o decretar, os portugueses podem não o saber, mas Portugal está de luto. Morreu hoje um dos seus grandes. Morreu Mário Cesariny. Ensaísta. Poeta. Pintor. Homem livre. Aqui fica um dos seus poemas, um poema maravilhoso e eterno, que em tempos me foi oferecido pela Ni, amiga de vida inteira que não quis casar comigo.


Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto tão perto tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura
Em todas as ruas te encontro

em todas as ruas te perco

Violência doméstica

O Público informa hoje que o "Governo quer que as mulheres vítimas de violência doméstica fiquem isentas de pagar taxas moderadoras quando, na sequência de agressões, têm de recorrer às urgências e internamentos nos hospitais, anunciou ontem o secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Jorge Lacão."
Esta intenção, no plano teórico, parece louvável, mas o ideal seria, evidentemente, responsabilizar os agressores pelo pagamento do tratamento das agressões. Assim, eu, a leitora e todos os contribuintes, continuaremos a sustentar o devorador SNS.
Sejamos um pouco pessimistas e tenhamos em conta a adoração que os portugueses têm por borlas: quem já assistiu à distribuição de pacotes de detergente e de bolachas à entrada do metropolitano ou quem se lembra daquele gigantesco almoço na ponte Vasco da Gama, sabe que é verdade esta inclinação. Eu não quero zombar do sofrimento de quem é maltratado e agredido em sua própria casa, e a criminalização de tais actos é correctamente contemplada pelo Código Penal. Mas não me surpreenderia se houvesse quem recorresse à violência para assegurar tratamento rápido e grátis no Hospital: cuidar-se-ia do olho e da dor de estômago.

sábado, 25 de novembro de 2006

Sabedoria portuguesa III

"Lisonjear o Poder é mau: mas lisonjear a multidão é pior".

Armindo Monteiro

Persistência da Memória

Africano inventivo

República Federativa de Portugal e África

Quando tiverem desaparecido os responsáveis que arruínaram Portugal em 1974/1975, quando tiverem morrido os corruptos que destruíram Angola e Moçambique; quando uma nova geração letrada e inteligente, que entenda de economia e conheça a história, que tenha visão e ousadia, ocupar o poder em Lisboa, Luanda e Lourenço Marques, será criada a República Federativa de Portugal e África. Pode demorar 20 ou 50 anos. Mas existirá.

Bellevue

Do tempo em que os GNR eram uma senhora banda. Eis a melancólica Bellevue:

Bellevue

Fundido na brumano nevoeiro sem fim
Uma ideia brilhante cintila no escuro
Um odor a tensão do medo puro

Salto o muro cuidado com o cão
Vejo onde ponho o pé iço-me a mão

Encosto ao vidro um anel de brilhantes
É de fancaria a fingir diamantes

Salto à janela com muita atenção
Ponho-me à escuta bate-me o coração

Sabem que me escondo na Bellevue
Ninguém comparece ao meu rendez-vous

Porta atrás porta pelo corredor
O foco de luz no último estertor
No espelho um esgar, um sorriso cruel
Atrás da última porta uma cama de dossel

Salto para a cama experimento o colchão
Onde era sangue é só solidão

Os meus amigos enterrados no jardim
E agora ninguém confia em mim

Era só para brincar ao cinema negro
Os corpos no lago eram de gente no desemprego

Mal por mal

Há 200 anos o sofredor povo de Lisboa repetia "mal por mal, melhor Pombal".

sexta-feira, 24 de novembro de 2006

Parabéns CML

A coisa não está ao alcance de qualquer munícipio, pois é preciso juntar a capacidade à vontade. Mas o município liderado por Carmona tem essas qualidades em doses fartas. E hoje, dia de intensa e ininterrupta chuva, deu-se a proeza: a cidade alagou-se e a CML, especialista na produção de inundações, brindou os lisboetas com mais uma. Hoje caminhámos sobre as águas, hoje sentimos as delícias dos pés encharcados e do trânsito barulhento a passo de caracol.
Grande Carmona: quando chover durante 3 ou 4 dias consecutivos, teremos piscinas no Terreiro do Paço e em Belém.

Lisboa

Lisboa, triste cenário do 25 de Abril, perdeu importância internacional com a amputação de Portugal em 1975, mas não perdeu a beleza, apesar dos disparates urbanísticos que o Município tem autorizado e do trânsito stressante que faz esbanjar tantas horas a tanta gente. Lisboa não é Portugal, mas é a nossa cidade mais estimulante. Em Lisboa só se enfada quem gosta do tédio. Lisboa tem carradas de cinemas rendidos a Hollywod, tem diversos teatros sustentados pelos contribuintes que se estão nas tintas para a "cultura" e que concordam que se gastem milhões de euros em cultura teatral, Lisboa tem gigantescos e apelativos centros comerciais que fazem crer a quem os frequenta que Portugal é um país moderno e funcional, tem museus muito visitados por estrangeiros que testemunham a penúria da nossa pintura renascentista e a pujança da nossa azulejaria barroca, Lisboa tem proezas da engenharia como a ponte Vasco da Gama e a ponte Salazar, tem áreas deslumbrantes que enobrecem a nossa arquitectura como o Bairro Alto, o Chiado, a Baixa e o Parque das Nações, Lisboa tem universidades muito bem apetrechadas, tem igrejas onde nos refrescamos, descansamos e comemos um gelado enquanto olhamos o altar, Lisboa tem os pastéis de Belém e o Tejo que parece o mar, tem estações de metropolitano recheadas de obras de arte e centenas de empresas competitivas que dinamizam a economia, Lisboa tem céu azul no outono e no inverno, tem o milagre da Gulbenkian e o imponente CCB. E por último, Lisboa tem meninas e mulheres deslumbrantes que embelezam as ruas: bonitas, impecavelmente vestidas, confiantes. Quase provocam a necessidade de que se lhe diga parabéns.

O amor mata

A notícia impressionou-me: uma mulher de 36 anos, absolutamente desvairada e embrutecida pelo sofrimento amoroso, suicidou-se e matou os seus dois filhos, ao atirar o carro para o rio Douro. Matar os filhos foi a fórmula de punir o marido.
Isto lembra-me a evidência que muitos têm repetido ao longo dos séculos: o amor é perigoso. Por isso, aqui fica o apelo: quando amar não esqueça que o amor pode arruinar a lucidez e a generosidade, que pode gerar dependência e ciúmes loucos.
Pela sua saúde, não ame em demasia.

quinta-feira, 23 de novembro de 2006

Salazar visto por Marcelo Mathias

Marcelo Mathias foi durante a sua vida funcionário do MNE. Foi cônsul no Rio de Janeiro, chefe da Repartição de Negócios Políticos, embaixador em Londres, ministro dos Negócios Estrangeiros. Elaborou, aos 36 anos, o projecto do Pacto de Amizade e Não Agressão entre Portugal e a Espanha, assinado em Março de 1939. Elevou-se da base ao cume da hierarquia, graças à sua inteligência, dedicação e patriotismo. Como Salazar apreciava colaboradores competentes que o pudessem auxiliar na governação, Marcelo Mathias colaborou naturalmente com Salazar. Foram muitas as horas de trabalho comum e muitas as preocupações partilhadas, norteadas pelo propósito de defesa dos interesses permanentes de Portugal. Salazar, em noite de enorme tensão diplomática, "levou-me então para uma sala contígua ao seu gabinete de trabalho e sugeriu-me com grande afabilidade que me deitasse num divã ali existente a fim de repousar por uns momentos, tendo ido buscar pessoalmente uma manta para eu me cobrir."
Depois deste episódio, ficou selado o destino das relações entre os dois. Ambos sabiam que podiam contar com o outro, ambos sabiam que poderiam continuar a trabalhar em conjunto.
Em 1984, Marcelo Mathias publicou a correspondência que durante mais de 20 anos manteve com Salazar. É dessa obra que se extrai o que se segue:


"Salazar conhecia bem os assuntos de Estado devido à sua longa permanência no Governo e a sua capacidade de trabalho e a sua competência levavam a maioria dos seus colaboradores a ter a tendência de de submeter à sua consideração os assuntos mais importantes nas respctivas esferas de acção. No entanto, no trato quotidiano e nas relações de trabalho, Salazar estava longe de ser uma natureza autoritária. Ouvia com atenção o que se lhe dizia, mostrando-se receptivo para os pontos de vista dos seus interlocutores quando estes pela sua lealdade e sensatez lhe mereciam confiança. Admitia opiniões discordantes das suas desde que os argumentos invocados em sua justificação lhe parecessem fundamentados, e fossem apresentados com o tacto necessário quando se pretende discordar de alguém que mereça o nosso respeito. Nos anos em que colaborei com ele, nunca fez junto de mim qualquer pressão ou manifestou um empenho que acarretasse uma limitação da plenitude de autonomia que eu possuía no exercício dos meus cargos. Também gostava de pôr à prova os seus colaboradores.
Inicialmente, Salazar revelava a quem era chamado a trabalhar com ele um carácter porventura excessivamente severo e austero, pouco propício a manifestações de simpatia e apreço, sendo muito parco no plano do adjectivo lisonjeiro e de uma grande avareza em referências elogiosas.
A maior parte das pessoas, intimidadas pelo enorme prestígio de que ele gozava, aproximavam-se dele já embaraçadas, perdendo por vezes algumas faculdades que as tornavam mais marcantes nos seus meios, pelo que tive ocasião de ver muitas que desfrutavam da reputação de serem personagens notáveis saírem junto de Salazar como que reprovadas. Tratava-se de uma espécie de exame a que eram subetidos os seus colaboradores, mesmo eventuais, podendo dizer-se que os outros estavam em exame permanente. Era muito ingrato, fazer diante de Salazar, uma afirmação estatística de ânimo leve, citar arbitrariamente números, porque ele inquiria logo quais os elementos em que se baseava essa avaliação e perdia rapidamente a consideração pelo interlocutor se este não estava em condições de demonstrar a proibidade do seu fundamento. Num país de afirmação fácil como o nosso, onde se fazem, tantas vezes, declarações grandiloquentes ou superlativas, talvez sem má intenção mas por excesso de imaginação, a objectividade magistral e as exigências de lente universitário de Salazar levavam muitas pessoas a sentirem a consciênciaincómoda da reprovação incorrida numa audácia inútil e comprometedora. Para Salazar a leviandade e a gratuitidade das afirmações eram impossíveis e detestava as naturezas categóricas e dogmáticas.
Era no fundo um tímido que se refugiava num aparente olimpismo nas cerimónias públicas para afastar um certo número de impertinentes, mostando-se avesso às demosntrações mundanas e sociais bem como às manifestações de entusiasmo público cuja precaridade e versatilidadenão ignorava. Não aceitava convites para jantares ou para festas e sustentava que se frequentasse os salões mundanos perderia grande parte da independência de acção quando chegasse o momento de tomar quaisquer deliberações susceptíveis de afectar pessoas ou interesses que estivessem por detrás desses convites . A timidez de Salazar explica algumas das suas atitudes que foram objecto de críticas, como facto de muitas vezes exonerar os ministros por carta, tendo estado pessoalmente com eles nesse mesmo dia sem se referir ao assunto. Nesse tipo de cartas Salazar invocava que não queria abusar da dedicação e do esforço de que o destinatário dera já mostras na governação do País, e utilizava fórmulas amáveis e corteses pare dispensar os serviços e a colaboração de quem ele considerasse haver esgotado qualidades para continuar a exercer funções."

Mousse de limão

Meninas e meninos

Ganhem coragem e avancem para a cozinha. Espera-vos uma sobremesa fácil e deliciosa, que me foi dada a comer por uma prendada amiga que cozinha maravilhosamente. Até um inepto como eu consegue fazer mousse de limão. É espremer dois limões, juntar-lhe uma lata de leite condensado e quatro iogurtes naturais sem açucar. Bater a mistura e guardá-la no frigorífico.
Ao fim de uma hora, abrir o frio doméstico e devorar a mousse.

quarta-feira, 22 de novembro de 2006

Querido blogue

Querido blogue

Desculpa estes dias de ausência. Bem sei que precisas ser escrito, mas os dias, lamentavelmente, continuam apenas a ter 24 horas e eu muito atarefado. Às vezes esqueço-te e outras vezes o zapp prova que é manhoso serviço.
Posso dizer-te que troquei umas palavrinhas com o famoso Professor Marcelo Rebelo de Sousa e que confirmei o que presumia: o senhor é prático e despachado, afável e de boa memória. Parece que consegue pensar em três assuntos diferentes ao mesmo tempo, coisa que impressiona e delicia. Estou optimista: acredito que terá a gentileza de me prefaciar um livrinho.

Adeus blogue

sexta-feira, 17 de novembro de 2006

Diz-me quem preferes...

Toda a gente está habilitada a responder: qual destes estadistas tem a sua preferência, simpatia ou admiração: Salazar, Soares ou Cavaco ?

Uma fórmula muito difícil

Competência + Lucidez + Patriotismo + Autocrítica = Desenvolvimento

Sabedoria portuguesa II

"É difícil, bem sei, levar os homens a falar só do que entendem, mas é pena, porque se evitariam muitas palavras inúteis."

O.S.

quinta-feira, 16 de novembro de 2006

Quando Portugal

Caro Senhor Primeiro Ministro sabia que, segundo as estatísticas oficiais citadas pelo então ministro da Economia, Correia d´Oliveira, em 1965, "alguma coisa de sério e de consolador" se estava a pssar "no campo da indústria". O que de animador se passava era a singeleza de "entre 1959 e 1963 as exportações de produtos industriais, para as áreas da EFTA e do Mercado Comum" terem aumentado "respectivamente de 240% e 85%".
Isto era, senhor Primeiro Ministro, crescimento económico a sério, sustentado e duradouro. E era crescimento que se fazia sob o apoio e o impulso do Estado português, que coordenava com rigor a economia, que aceitava e sabia captar investimentos internacionais, mas não precisava de receber fundos comunitários de um organização supranacional para se modernizar.
Eram os tempos em que Portugal era o gestor dos seus destinos. Em que os orçamentos eram equilibrados, o escudo era uma moeda forte e os contratos eram respeitados. Em que Portugal era um País independente, vasto e cobiçado.
Os tempos em que se trabalhava a valer, em que a produtividade nas empresas e no Estado atingiu números nunca mais repetidos. Era um País que sabia ter ainda muito para corrigir, para melhorar, para construir.
Eram os tempos em que Portugal era um País orgulhoso de si, que estava tão preocupado com as guerras de África quanto empolgado com o seu progresso. Era um País optimista com o seu futuro, que se planeava a médio e a longo prazo. Era quando Portugal mandava em Portugal.

Para quem não sabe

Há muito boa gente - gente letrada, informada, que sabe opinar - que acha que Portugal antigamente era um triste e atrasado País, parado no tempo e isolado no mundo por culpa da teimosia de um velho senhor incapaz de se adaptar às mudanças sociais.
Esta boa gente tem um tremendo defeito que a prejudica e a leva a aceitar as barbaridades que em tempos ouviu na tv ou leu em jornais e revistas: estas pessoas que levam inquéritos criminais ou testes para ler em casa, enfadam-se com o estudo da História, acham a História relíquia desnecessária; e por isso, são muito ignorantes em matéria de História. Preguiçosas para estudar o que não lhes traz qualquer utilidade profissional, estas pessoas também se destacam pelas suas deliciosas contradições: acham os bancos entidades que abusam exageradamente dos juros mas recorrem ao empréstimo para a compra de casa; acham que os homens são quase todos iguais mas não dispensam a sedução; acham que as crianças hoje crescem com demasiadas facilidades e inundam os seus filhos de bens quase luxuosos; estão saturadas dos seus trabalhos mas não lhes passa pela cabeça mudar de vida; adoram criticar Portugal e quase desconhecem o seu passado.
Ora, não é ilegítimo admitir que quem não se interessa com o passado colectivo, pouco cultiva o seu passado. E não é disparatado admitir que quem desvaloriza o que já viveu, quem não acautela a passagem do tempo e quem não previne a degradação da sua memória, escrevendo sobre si, sobre a sua vida, está a dizer-nos que pouco se tem conta, pois não se acha matéria merecedora de ser registada pela palavra.
Isto serve para lembrar a quem diz que não gosta de História que reflicta na frase antes de a pronunicar. A História não é apenas a mais completa ou eclética das ciências sociais.
A História é a memória da Humanidade. É o esforço de não esquecer e de tentar compreender os que já morreram. É recuperar os seus sofrimentos e as suas conquistas; as suas destruições e as suas criações. A História é a crónica sem fim da ambivalência humana. Sem os mortos que nos transmitiram genes, hábitos, valores e património, não estaríamos aqui, eu a escrever e tu a ler. Porque foram melhores que nós, talvez os desdenhemos.

quarta-feira, 15 de novembro de 2006

A tristeza aos 21 anos

Uma menina talentosa, culta e politicamente sensata, enviou-me e autorizou-me a publicar o texto que se segue. A capacidade de verbalizar com mérito literário o sofrimento e o amor é evidente. Daí o seu registo.


O Amanhecer…

Será que o coração quebra?...
Colo os bocadinhos partidos do sonho, com as lágrimas. É verdade…sentimo-nos sempre mais fortes quando alimentados pela ilusão, num ego desmedido de amar e ser amado. Uma crença idiota, como uma criança inocente à procura das prendas por debaixo da ponte…
Não há um pedaço de nós que queira ser solitário, nem uma só frase que não surja para ser ouvida. Por isso nos dói tanto o silêncio. A inutilidade. O vago. O nosso próprio eco como resposta. São falhas de pensamento…
Discursos sem plateia. Diálogos eternamente escondidos pela vergonha de se ser algo que não reconhecemos. A vida é uma peça de teatro, alguém disse. Que autores mais incompetentes, que guião mais oco, mais fútil. Um espelho da mediocridade do poeta que sente…
Procura-se a esperança por debaixo de folhas mortas. Não há árvores que para sempre durem. As vítimas do conto de fadas somos nós, os sonhadores. Um mesmo buraco, tantas quedas diferentes. Trambolhões elaborados num caminho que conhecemos como a palma da mão…
Recriar a realidade. Abafar o que sabemos. Construir um palco de madeira podre. Um alçapão de mentiras úteis. Engolir os gritos. Engolir as mágoas. Engolir o orgulho vão. Contemporaneidade do Sentir. Fechar os olhos à verdade é tão mais fácil…
Correr atrás do Tempo. Curvar a Morte. Desviar a Vida. Enganar os trilhos já traçados. Caminhar pelos mesmos passos. Um círculo interminável em torno de uma fogueira extinta. Ano Novo…
Amanhecer para a vida de vista vendada. Acordar todos os dias pensando que o sol brilha sempre igual. Adormecer todas as noites com a cabeça flutuante na almofada de valores perdidos.
Papoilas, incenso, camomila…e o soro da mentira. Um café e acordamos sempre tão iguais ao que fomos, e tão diferentes do que queremos….

terça-feira, 14 de novembro de 2006

Não há puto mais lindo















Eis o puto mais bonito do planeta e arredores.
É inteligente, meigo, sociável e falador.
E muito teimoso, capaz de barulhentas birras.
É a grande alegria da família.
É o Gonçalo.

3º mundo livreiro

Os editores estão reunidos em Congresso: isto é, põem a conversa em dia, suspiram aspirações, pedincham apoios públicos, malham em deficiências. Leio no Público que se queixam de não existirem estatísticas fiáveis sobre o sector, carência que lhes complica um pouco a vida.
Por não saberem os nossos editores, por exemplo, quantos livros anual e mensalmente se publicam, pode acontecer a editora do senhor António publicar uma obra que a editora da senhora Amélia lançou no mercado há três anos.
Não haver estatísticas é um bocadinho aberrante : o Instituto Nacional de Estatística é há muito tempo um dos melhores serviços da nossa Administração Pública; o IPLB tem a missão de apoiar o sector, financiando a publicação de autores portugueses e de autores lusófonos, salvando da falência algumas editoras; as associações corporativas do mundo livreiro podem sem dificuldade produzir essa informação. Por isso fica a pergunta: quem são os responsáveis pela inexistência das comezinhas estatísticas ?

Nestum

Diz-se que o que é doce nunca amargou. Como amarguras não faltam, registo uma sugestão que adoça a boca. Porque não havia nestum com mel, o nestum que fielmente como ao pequeno-almoço há mais de 20 anos, decidi arriscar o nestum de maça e canela. Acabei de o comer. E meninas: é uma delícia. Provem-no e não se preocupem com a tolice de quatro ou cinco quilos a mais.

segunda-feira, 13 de novembro de 2006

Para as leitoras duas senhoras

Às fortuitas ou avisadas leitoras deste blogue fica a sugestão de leitura de dois livros escritos por duas notáveis investigadoras, por duas brilhantes senhoras das ciências sociais: La crise de la culture, de Hannah Arendt, e Gulag, a History, de Anne Applebaum, são obras imperdíveis.
Disponíveis na FNAC a um preço bastante acessível, um preço que nos faz pensar nos preços das editoras portuguesas.

sexta-feira, 10 de novembro de 2006

Sabedoria portuguesa

"A vida não é um sistema nem cabe num sistema. A vida não cabe numa fórmula."

Marcello Caetano

quinta-feira, 9 de novembro de 2006

A nossa desditosa esquerda

Não falta quem considere que o tempo da acentuada separação ideológica passou à história: putativamente, os imperativos da implacável concorrência da economia mundializada e os permanentes fundamentos jurídico-administrativos de qualquer Estado, roubaram pertinência às discussões da filosofia política, aproximaram doutrinas, diluiram diferenças programáticas, converteram inimigos irredutíveis em cordiais adversários que podem consensualizar posições.
A realidade parece confirmar a parcial verdade destes pressupostos. Mas a pragmática adaptação dos agentes políticos às duras complexidades dos tempos que correm não elimina a utilidade de assinalar o que ainda os distingue. Se a política é a arte do possível, muitas possibilidades de estudo existem para a definição e a decisão políticas, áreas onde a inteligência e a liberdade de escolha podem e devem exercer-se.
Este artigo tem a finalidade de veicular uma visão da esquerda portuguesa substancialmente distinta e antagónica das visões que as diferentes esquerdas difundem sobre a esquerda. Quem o escreve tem dois méritos: não é, nunca foi e nunca será adepto da esquerda, soube evitar o estéril desgaste de odiar a esquerda.
Para se tentar compreender e conhecer a esquerda portuguesa importa recuperar o seu passado recente, importa lembrar o período que marca a fundação do domínio institucional e cultural da esquerda sobre Portugal.
É incontestável que em Portugal a esquerda manda desde 1974. O golpe militar de 25 de Abril foi por ela planeado e executado. Ter confiado a Spínola a liderança do MFA e ter amalgamado no MFA militares de diferentes orientações políticas é pormenor que não anula o fundamental esquerdismo, consciente ou não, dos golpistas a quem o regime autorizou o triunfo.
E autorizou porque, Marcelo, avesso a repressões, mesmo que cirúrgicas, coagido por uma urgência temporal que não facilitava a reflexão, rodeado de gente dúbia, confiante na capacidade moderadora de alguns generais, ao não permitir que a GNR e a PIDE/DGS jugulassem o restrito movimento, confessava o seu cansaço e o do Governo. Altivamente recusou lutar, como se a impertinência corporativa dos militares revoltados o tivesse convencido da inutilidade de continuar a pregar no deserto de uma elite pouco segura do que queria e confusa sobre o que não queria. Deste desnorte mental, destas dúvidas que desmoralizam e paralisam, se aproveitou a esquerda, impregnada de audácia, euforia e certezas.
Porque a esquerda não comunista tem aprendido e evoluído ao longo destes trinta anos de democracia partidarista convém lembrar como era a esquerda portuguesa em 1974.
Dividida em múltiplas organizações de variada implantação social e importância quantitativa, fragmentada em partidos que louvavam a ditadura do proletariado e partidos que admiravam as meritórias realizações da social democracia europeia, a esquerda pulverizava-se e polemizava-se em minúcias estratégicas mas possuía elementos decisivos para uma unidade determinante que conduziu à fulgurante vitória. A partilha de objectivos comuns e de um minímo de sólidos valores ajudaram a esquerda a conquistar o Poder.
O que unia então a nossa dinâmica esquerda ? Primordialmente, a esquerda tinha e vivia com fervor um património sentimental composto pela absoluta rejeição do Estado Novo, pelo sofrimento das perseguições policiais aos militantes mais activos, pelas frustrações que os sucessos do regime provocavam, pelas expectativas desfeitas das campanhas eleitorais invariavelmente ganhas pelos candidatos da União Nacional. O frentismo antifascista fantasiara o monstro da ditadura, unia a esquerda nos seus devaneios utópicos e atenuava a importância das suas diferenças. Cheia de rancores e desejosa de vingança, a esquerda odiava abertamente. E se alguns se contentaram em decretar o exílio dos derrotados, outros sonharam fazer derramar o sangue fascista.
Ora quando se odeia, os ânimos exaltam-se. Coisa dispensável porque a queda do regime já inundara de felicidade muita gente. Mas os nossos emotivos esquerdistas eram insaciavelmente dados à excitação mental. Ao ódio juntaram as alegrias de uma secular fé redentora. O resultado não poderia ter sido outro: os dirigentes e os militantes eram camaradas pouco preparados para sensatamente administrarem a realidade. O voluntarismo entusiasta esmagou as possibilidades da lucidez analítica que a gestão dos assuntos públicos sempre exige: estavam criadas as condições para que os disparates acontecessem a uma frenética cadência.
Para além de gritar invectivas e ameaças, a esquerda vivia o extasiamento de berrar sem obstáculos o seu marxismo-leninismo e o seu socialismo democrático. O primeiro merece mais atenção porque logrou, apesar de tão minoritário, efectivar parte substancial do que preconizava. Continua a causar alguma admiração que pessoas inteligentes ainda acreditem na na bondade da doutrina marxista e na viabilidade de Estados que dela se reclamam e nela se inspiram para desgorvernar diferentes povos. A neurologia tem explicado as capacidades e o funcionamento do cérebro humano, mas jamais conseguirá encontrar as provas que permitam compreender o fenómeno. A ingenuidade e a revolta, próprias da adolescência, não bastam porque abundam comunistas de idade avançada. A ideia da genérica malignidade de qualquer comunista é também imprestável porque muitos comunistas são generosos e estimáveis.
Quando dizemos estranhar e lamentar que o marxismo seja tão arreigadamente professado e tão facilmente propagandeado, pensamos nos seus dogmas e nos seus resultados práticos.
Sem pretensões de profunidade, porque a matéria tem sido amplamente estudada por brilhantes académicos, o marxismo acredita ...



Aproveitando a embalagem revolucionária que dinamizou e explorou, apoiada nas conquistas políticas que logrou impôr ao país, a esquerda, cegamente orgulhosa de si mesma e convencida da sua superioridade moral, foi ditando as suas regras, prescrevendo as suas manias, infligindo as suas aversões. Tão forte era, tão forte se sentia, tão pouca resistência encontrou a sul do Douro, que a nossa esquerda se permitiu o luxo de, imitando o império soviético, distorcer o passado, inventar uma realidade que não existia, prometer o utópico paraíso da sociedade sem classes. Desfraldando a bandeira do democratizar, descolonizar e desenvolver, a esquerda foi a campeã da demogagia, do qual abusou sem escrúpulos.
As suas promessas, mentiras e calúnias, foram pródiga e impunemente praticadas. Animada do seu típico optimismo, a esquerda contou, na sua obra de destruição e de delírio, com a colaboração da direita. Assustada com o histerismo das massas aduladas, atarantada com as exigências eufóricas da esquerda, diminuída pelo seu absurdo sentimento de inferioridade, a direita encolheu-se de medo. E cheia de medo, calou as realizações que tinham desenvolvido e fortalecido Portugal. Consentiu a diabolização de Salazar e Caetano. Negou os seus valores essenciais e desmintiu a sua existência. Com a excepção de um punhado de lúcidos que não se rendeu, a direita suicidou-se. Cabem-lhe culpas que jamais expiará: o PSD aprovou a Constituição de 1976 e o CDS contra ela apenas tenuemente protestou com uma inverosimil abstenção.
Com início de reinado tão avassalador e programaticamente bem sucedido, a esquerda instalou-se com conforto no poder. E actuou ao sabor dos seus desvarios. Arruinou a disciplina militar, dividindo as Forças Armadas e fazendo de numerosa tropa um desleixado bando de papagueadores de fantasias. Converteu às três pancadas juízes e autarcas. Tomou de assalto a imprensa e os antigos sindicatos corporativos. Como não sabia o que era governar, saneou milhares de competentes servidores do Estado, prendendo muitos sem culpa formada, substituindo-os por gente fanática ou medíocre. Trocou a qualidade pela quantidade, a experiência pela impreparação. A análise ponderada pela precipitação. Desorganizou serviços e aumentou as despesas públicas. Empobreceu o Estado que encarou como coutada sua, propriedade para pagar favores e promessas, para saciar clintelas e vaidades. Democratizou as universidades, instalando o facilitismo, tolerando as lutas entre estudantes, diminuindo o prestígio dos professores. Atarefada com as excitações e as torpezas das lutas partidárias, a esquerda negligenciou a prosaica administração, piorando-a dramaticamente: prova-o a singular aberração de engordar o Estado ao mesmo tempo que reduzia Portugal à sua pequenez europeia. Por pragmatismo e necessidade; e como era servida por algumas distintas inteligências, a esquerda não inutilizou toda a obra do Estado Novo. Aboliu oficialmente o corporativismo que marchava em salutar e prometedor caminho, mas alargou a Previdência, convicta da bondade do acto e escrava das suas promessas.
A organização económica do país e a a questão ultramarina macularam irremediavelmente o regime. A inevitável integração europeia salvou-o da dissolução mas não o redime. Conseguida após 1o anos de governos instáveis e frágeis, a adesão à CEE foi a tábua de salvação para um pobre desesperado. Sendo indesmentível que a Europa tem tornado possíveis as obras públicas, a qualificação dos recursos humanos e a renovação tecnológica de milhares de empresas, importa não esquecer que ela consagra a nossa dependência e que tem sido assaz desaproveitada.

(Como vão sendo horas este texto será retomado e concluído brevemente. Promessa de menino deseducado pelo ensino da esquerda ).

A aversão sempre presente

Serão poucas as pessoas que não têm qualquer fobia ou aversão. Há quem tenha medo de cobras e lagartos, quem se enoje com ratinhos e ratazanas, quem não consiga viajar de avião ou de metropolitano, quem deteste negros ou sonhe com o extermínio de muçulmanos. Bastam estes exemplos, porque a lista é ilimitada. O ser humano é tão racional quanto irracional, e quando se é muito teimoso ou muito estúpido não há razão que nos acuda.
Ora eu não sou alheio ao fenómeno. Tenho a minha duradoura e invencível aversão. Coisa inofensiva e íntima, porque não descamba para a violência ou para o insulto, não impede a comunicação ou até o convívio.

A minha aversão chama-se comunismo, são os comunistas colectivamente organizados com a finalidade de desenvolverem acção política. Isto não impede boas surpresas: um dos meus grandes amigos, eterno amigo, foi militante da JCP e ainda hoje vota, aqui e ali, no PCP.
A alienação ideológica do Renato começou na infância e durou até aos vinte anos. Poderia ainda durar se ele tivesse mentalidade de ovelha ou não exercitasse a sua inteligência. Mas o Renato sabe pensar sozinho, é pouco dado a disciplinas impostas de fora e deixou de acreditar em delirantes utopias. Mais: passou a acreditar na legitimidade da iniciativa privada, na força motivadora de não depender de qualquer patrão e criou a sua empresa, que caminha venturosa pelas planícies alentejanas e as ruas algarvias.

Feito este desvio para apresentar o Renatinho, retomo a minha aversão. Abomino, pois, comunistas. Como não sou totalmente ignorante da História contemporânea, sei o que gasta a casa comunista. Como o sabem os portugueses cuja memória não é curta. Os comunistas, que souberam vestir a pele de cordeiro, que foram tontamente subestimados pelos seus adversários nos loucos governos provisórios do PREC, conseguiram forçar as nacionalizações e o abandono do Ultramar, foram decisivos no arruinar da economia e no empobrecimento territorial de Portugal.
Sintetizando: são, juntamente com as eminências vaidosas do PS, os principais culpados por um dos maiores desastres da história portuguesa. Comparado com as devastações do PREC, o desastre militar de Alcácer Quibir foi apenas um infeliz passeio em Marrocos.
Mais contundentes e sentidas na pele, são as palavras que citarei a seguir, escritas por um polaco em 1956. O acerto delas é incontroverso, a sua validade universal, a utilidade de as revelar perene: os regimes socialistas, os regimes em que o único partido existente era o Partido Comunista, criaram sociedades como aquela que nos é axiomaticamente revelada por Kilalkowsky.
É o mínimo que se pode fazer para lembrar os milhões de pessoas assassinadas, torturadas e silenciadas por regimes comunistas.

- Uma sociedade em que se vive muito melhor se não se crê e não se pensa nada;

- Uma sociedade em que qualquer pessoa, mesmo sem ter cometido algum delito, vive sempre à espera de ver chegar a polícia;

- Um Estado em que se pode condenar sem prévio julgamento;

- Um Estado em que na maior parte das vezes estão de acordo o advogado de defesa e o delegado do ministério público;

- Um Estado que está sempre satisfeito consigo mesmo e que jamais considera que errou;

- Um Estado que exige que os cidadãos tenham as mesmas ideias em política externa, economia, arte, literatura e moral;

- Um Estado que pensa ser capaz de redimir, sozinho, a humanidade;

- Um Estado em que os trabalhadores não têm qualquer influência no Governo;

- Uma sociedade em que é normal que dez pessoas vivam num quarto;

- Um Estado em que se conhece sempre com anterioridade o resultado das eleições;

- Uma sociedade que é toda melancolia ;

- Um Estado que pode maltratar qualquer pessoa impunemente;

- Uma sociedade em que as pessoas são desgraçadas se dizem o que pensam.

São assim as sociedades socialistas, exclusivamente geridas por partidos comunistas. E em Portugal o nosso Partido Comunista, que nunca criticou regime socialista algum e que nunca se cansa de criticar os EUA e Israel, é considerado pessoa de bem.




Pedaços de uma entrevista

Hoje vou jantar com um prestigiado professor universitário, desconhecido das massas mas muito conhecido no meio académico. Soube da sua existência em 1993, quando li uma entrevista publicada na saudosa revista K, dirigida por Miguel Esteves Cardoso, então bastante legível.
Entrevistado por Rui Zink, o professor Marques Bessa disse, entre outras coisas, o que se segue.

"...Em Maio de 68, naquelas revoluções ligeiras, os estudantes achavam que copular em frente do Arco do Triunfo ia mudar catastroficamente a França. Claro que não mudava nada. Copular no Arco do Triunfo ou copular aqui ao pé da Ribeira, é o mesmo: não altera coisa nenhuma, não tira o Cavaco do poder. Não há nenhuma revolução sexual que altere a estrutura do poder porque a elite está-se marimbando para isso. A sociedade dos homens não se baseia no sexo.
K - Então em que se baseia ?
O grande vínculo de união nas sociedades humanas é: uns mandam nos outros. E como é que se manda? Por eleição, por nomeação, por competição, por todos os sistemas.. Os que mandam, mandam. E tecem a estrutura que une todos através de uma hierarquia. As relações sexuais para que é que servem ? Servem para reproduzir indivíduos que são obedientes e outros que serão dominantes. Não servem para mais nada."
K - Qual seria a sua elite ?
Isso é um grande drama. Nós, na universidade, somos muito bons a criticar. Somos capazes de destruir tudo, mas quando nos perguntam: Então e o que é que você propunha?, temos dificuldades imensas em dar uma solução porque estamos cheios de dúvidas. A minha resposta é:o que nós precisamos é de uma sociedade forte. As elites são sempre grupos de interesses profundos de que temos de desconfiar.

K - Você levou a sério aquela coisa do Otelo: vamos meter os fascistas no Campo Pequeno?
Ah pois com certeza! E vamos limpá-los. Se o processo avançasse na sequência que havia sido projectada havia uns tipos que eram mortos. E portanto a tal revolução sem sangue tornar-se-ia uma revolução com sangue. Euaprecebi-me disso muito cedo. E por consequência quando chegou ao meu conhecimento que tinha um mandato de captura...Vou ser preso, todas as garantias individuais estão suspensas, fazem o que lhes apetecer. Estes tipos tomaram o poder, vão fazer o que lhes apetecer. E quando lhes vieram pedir responsabilidades eu provavelmente já estou debaixo da terra. Isso não me convém nada. Não gosto do frio, de modo que tratei de ir para Espanha. Vivi três anos em Madrid.

K - E a censura? Aceita um Estado que censure?
Nós não podemos pôr esse problema de aceitar ou não aceitar. Temos força ou não temos força para impedir isso. Se não temos força, nem vale a pena tratar disso. Todos os regimes querem imprensas de aplauso, todos querem, não é? Num país democrático querem imprensa democrática. Imprensa que elogia a democracia e a democracia assim e a democracia assado! Você não consegue publicar nenhum artigo contra a democracia porque eles não deixam. É uma censura difusa. Se quer publicar um livro também ninguém o edita.
K - Mas quer dizer, prefere essa...
Eu prefiro clareza nos assuntos. Preferia era que este tipos dissessem: isto é uma democracia, temos censura - que é uma forma difusa de censura - subsídios de jornais ou subsídios para papel ou outrs meios...
K Sinceramente, eu prefiro a hipocrisia democrática à sinceridade autoritária..
Bem, é como eu disse, do ponto de vista do destinatário do poder o que é que lhe interessa? Interessa-lhe uma elite frágil. Uma elite dividida em partidos que se autodigladiam. Com um regime autoritário, só uma sociedade forte é que se consegue defender dele.
K - Mas acha que é o caso de Portugal ?
A nossa sociedade é tradicionalmente frágil. Sindicatos nomeados por partidos e frágeis. Universidades que não conseguem dizer nada. Os reitores estão ali: o Sr. Ministro e tal, curvam a cachola, andam por ali e tal. Olhe para as igrejas, o que é que a Igreja diz? Coitados, batem no peito, curvam a cabeça e acabou. Nós não temos aqui interpelantes verdadeiros, que sejam forças sociais interpelantes do poder. A não ser, evidentemente, os partidos. Mas os partidos são o poder. "

A leitora eventualmente interessada em toda a entrevista pode encontrá-la na Biblioteca Nacional, na Hemeroteca Muncipal de Lisboa ou em minha casa. Revista K, nº. 32, Maio de 1993, p.18-27.

Mais uma greve

Os trabalhadores do Metropolitano de Lisboa fazem hoje mais uma greve, a terceira em duas semanas. Eu já aqui escrevi que as greves são prejudiciais à economia e são inúteis quando as direcções sabem mandar: são um dos produtos da horrível mistura do liberalismo individualista com o socialismo ineficiente. O bom senso social dita a urgência da sua ilegalização. Isto não é novidade, pois se os polícias e os militares e os membros do Governo estão proibidos de brincar às greves, não parece lógico que outros grupos profissionais pertencentes à Administração Pública a elas possam recorrer: é uma evidência que o Estado se nega a si mesmo quando os seus funcionários decidem protestar através da greve. Sendo permanente e tendo a intenção de ser perpétuo, o Estado não deve fazer greve.
Mas o Estado parece padecer da doença bipolar. Ao ser incapaz de evitar os ociosos protestos, lembra-nos a sua impotência; autorizando que os seus grevem - acabou de nascer o verbo grevar -, o Estado diz-nos a todos que desculpem lá mas não me bastam as vossas obrigações fiscais, não me contento com a descomunal legislação que em tudo interfere: tenho que ter o poder de arbitrariamente vos foder a vidinha, nem que hoje seja apenas das 6.15 ao meio dia.

Em espanhol também serve

" Pensar es el trabajo más difícil que existe. Quizá sea ésta la razón por la que haya tan pocas personas que lo practiquen."

Henry Ford

terça-feira, 7 de novembro de 2006

Do que me livrei

Sempre que fortuitamente me cruzo com telenovelas portuguesas e com bandos de adolescentes, penso, satisfeito, Luís és um afortunado por não teres que ganhar a vida a fazer figuras tristes na televisão ou a tentar ensinar garotada aparvalhada e barulhenta.

Tal e qual

Com médicos novos

Taberneiros velhos

E má semente

Perdida está a gente

Directamente do AOS

Como sou um tarado por documentos de arquivo contemporâneos, que ando a fotocopiar quase compulsivamente, segue-se um, inédito, nunca antes publicado, apesar de conhecido pelos especialistas. Trata-se de uma carta escrita por Oliveira Salazar ao Generalíssimo Franco, em 31 de Julho de 1961. A subversão em Angola começara poucos meses antes e Salazar tremera. Reforçada a sua posição com o afastamento daqueles que queriam substituí-lo, Salazar definira o essencial da decisão do Governo com a célebre "para Angola rapidamente e em força." E assim aconteceu: com a eficaz defesa militar, Angola conheceria a partir de então espantoso desenvolvimento económico, o que a tornou cada vez mais desejada por Washington e Moscovo, que cobiçavam substituir Portugal, alegando, anedoticamente, que queriam a auto-determinação dos angolanos...
A carta destaca-se pela importância do assunto, pelo habitual realismo e pela franqueza de Salazar.


Ao Generalíssimo Franco

Recebi a penhorante carta de Vossa Excelência de 16 de Abril. Infelizmente nos três meses que são passados não pude dispôr de um momento para agradecer a espontaneidade e amizade do seu gesto, os votos que formula pelo êxito da nossa luta e o oferecimento da sua ajuda leal e firme colaboração. Sou infinitamente grato a Vossa Excelência pelas suas tão amigas expressões e pelo apoio que sob tantas formas temos sentido da sua parte e da parte da Espanha. Absolutamente confiados na sua promessa, continuamos a contar com esse apoio - ser-nos-á necessário contar com ele.
Como a Europa parece ter perdido o sentido da sua missão e os Estados-Unidos com dificuldade a compreenderão também, estamos sob o domínio de uma onda de subversão que os afro-asiáticos levantam e o comunismo internacional aproveita e muito bem para os seus fins.
Nós, portugueses, vamos sentir em toda a parte dificuldades sérias; mas o facto de os actos de subversão começarem agora a atingir os pequenos territórios que não podem ter destino diferente do que têm, parece indicar que as esperanças depositadas no terrorismo do norte de Angola começam a ser menos firmes.
Certamente a luta é extrordinariamente difícil e custosa; nem podemos convencer-nos de que por ora estamos aptos a lutareficazmente contra tal género de guerra. Mas como esta não poderá manter-se senão com o auxílio externo, om desenrolar dos acontecimentos será definido pela atitude das grandes potências, especialmentedos Estados-Unidos. Parece-me que estes se perturbaram um pouco e tomaram de começo atitudes infelizes; mas suponho estarem agora a rever a sua posição. Salvo o caso da Rússia poder vir a dominar a política do Congo, e daí dominar o resto de África sob influência ocidental, as coisas hão-de ir a pouco e pouco melhorando.
No nosso acso é através da política interna que também se pretende atingir o Ultramar; felizmente o povo tem o instinto da sua conservação e sobrevivência e está do lado dos que entendem dever lutar. Pendo sempre para o pessimismo e por isso não posso revelar-me inteiramente confiante tanto quanto às dificuldades internas como às do Ultramar; mas não julgo poder fazer-se outra coisa que não seja organizar o melhor possível a resistência e ganhar tempo à espera que o mundo ocidental compreenda os valores morais da nossa causa, senão o seu próprio interesse.
Renovo os agradecimentos que de todo o coração envio a Vossa Excelência pela sua extrema gentileza. Todos aqui temos a maior confiança no apoio e ajuda que pela Espanha Vossa excelência nos promete.
Peço aceite a expressão da minha mais subida consideração e da maior estima.
Afectuosamente,

Oliveira Salazar

domingo, 5 de novembro de 2006

A premonição

Creio que foi Salazar quem disse que os progressos da civilização iriam reduzir as liberdades do ser humano e, concomitantemente, aumentar a capacidade do Estado controlar e vigiar os seus cidadãos. É o que parece estar acontecer na livre Inglaterra, admirável democracia. Um relatório produzido pela Privacy International, organização não governamental, informa que existem em todo o Reino Unido 4,2 milhões de câmaras de vigilância, uma câmara para cada catorze pessoas!
Pois é. Temos variado menu eleitoral, temos disponíveis carradas de jornais, revistas e livros, temos a possibilidade de organizar inconsequentes manifestações, temos acesso fácil à ilimitada informação que circula na internet, temos autorização para fomentar greves, para criar associações que defendem as topeiras, para dormimos com quem conseguirmos, para fazer televisão que caricaturiza os que mandam. Temos tudo o que é tido por essencial para protestar e para satisfazer os nossos gostos. E o Estado, que consagrou e que está incumbido de defender todos estes direitos, tem um gigantesco arsenal tecnológico e jurídico que lhe permite saber que estradas percorremos, que marcas de roupa usamos, quanto poupamos, o que comemos e o que lemos, com quem falamos ao telefone.
Como se sabe insubstituível, como é o supremo gestor da sociedade, o sacaninha Estado esmera-se na ambivalência. E diz-nos, comam as cenouras, mas nunca se esqueçam que tenho o cacete; diz-nos gozem as liberdades do mercado, mas não se julguem mais fortes ou mais espertos que eu.

O miminho da magistrada

Maria José Morgado, procuradora-geral adjunta, especialista em criminalidade económico-financeira, estudiosa da corrupção portuguesa, disse ontem no congresso do obscuro PND de Manuel Monteiro, que "a direita é muito mais sensível aos temas da corrupção do que a esquerda, que tem uma dependência do aparelho e das funções do Estado". Sempre assim foi e sempre assim será, ilustre senhora.
A tristeza é a direita ser tão minoritária em Portugal, porque muitos dos portugueses que se sentem de direita, reiteradamente não votam.
O trágico é a deliberada escassez de recursos humanos da Polícia Judiciária destinados ao combate dos crimes de colarinho branco.

Welcome Santana

Leio que Pedro Santana Lopes quer voltar às lutas parlamentares. Esteve retirado a tratar do seu arquivo, a alinhavar Memórias talvez, a deixar correr o tempo para que se desvaneça a lembrança do infeliz episódio do seu Governo.
Infeliz, sobretudo, porque o não deixaram trabalhar: Sampaio, em exercício de refinada pulhice, duvidosa constitucionalidade e impagável favor aos camaradas do PS, tomou a iniciativa de dissolver um Parlamento que solidamente apoiava o Governo. Basta lembrar que o segundo catastrófico governo de Gueterres não funcionou melhor que o de Santana, e Sampaio não cometeu a ousadia de despachar o actual engenheiro dos refugiados.
Como os críticos em Portugal são pagos para criticar a eito, não faltou quem cobrisse de mimos Santana Lopes. Em Portugal a inveja é uma instituição e Santana Lopes ganhou dezenas de inimigos quando ocupou a Secretaria de Estado da Cultura: os rancores acumulados e a sede de vingança explodiram com a decisão de Sampaio, e Santana foi julgado e queimado na praça pública com uma sanha, no mínimo, grosseira.
Mas Santana é animal político. Sabe que a morte é a única definitiva derrota, sabe que quem hoje é aclamado pode amanhã ser insultado, sabe que não perdeu lugar de destaque entre a eternamente medíocre classe política portuguesa. Santana tem a escola do PREC e tem o mérito, de que muitos não se podem gabar, de nunca ter acreditado nas enormidades da religião marxista-leninista. De crédulo não pode ser acusado, de alienado ideológico também não. Parece um liberal, coisa rara em Portugal, onde os democratas tomam o Estado por pai que deve facultar a saúde e a educação aos seus filhos adultos, um pai que não sabe gerir a casa, um pai que gasta mais do que deve e pode gastar, um pai que os portugueses adoram acusar e a quem nunca se esquecem de pedir ajuda.
Como é fácil de concluir, Santana sabe que voltará à ribalta: a fraqueza do actual PSD, a sua incapacidade de criticar com acutilância e justificação, a impotência carismática de Marques Mendes, o determinismo eleitoral do País, concorrem para o regresso bem sucedido de Santana. O resto compete-lhe: que não tenha perdido a capacidade oratória, que estude em profundidade alguns dossiês, que não se descontrole emocionalmente quando no Parlamento houver debates importantes, que não descure os fatos de bom corte, que consiga rodear-se de meia dúzia de pessoas capazes. Welcome back Santana.

PP

Como as missas nunca me comoveram ou empolgaram, domingo é dia de Público. Estou a folheá-lo e já topei assunto para mais uma futilidade bloguistica. Encontrei uma afirmação do senhor Pacheco Pereira (PP) - vitalício comentador da TSF, estudioso do comunismo, admirador de Álvaro Cunhal, rebelde militante do PSD, homem de imensa cultura e infinitas opiniões, autor de um notável blogue - em citação destacada pelo jornal:

"Tenho pena que José Sócrates esteja a fazer muitas coisas que o PSD já deveria ter feito há muito tempo".

A frase é simples e merece atenção minuciosa. É notório que foi pouco pensada pelo seu autor: lamentar que Sócrates esteja a fazer coisas que já deveriam ter sido feitas é pouco patriótico e sugere inveja. Que desejaria PP ? Que Sócrates e a sua equipa tivessem estudado as matérias, concluído pela sua utilidade e urgência, e adiado a sua aplicabilidade ? Sócrates criaria mas não executaria, reservando esse mérito para futuros governos do PSD.
O que PP deveria ter dito, porque há faltas de rigor que são autênticas armadilhas, é que era uma pena que as coisas que estão a ser feitas, não tivessem sido anteriormante realizadas pelo PSD. Claro que isto se infere da afirmação de PP. Mas PP lamenta que Sócrates as esteja a fazer, embora pareça concordar com elas.
A minha dúvida é esta: porque continua PP militante do PSD, organização que tanto critica.
Tem a pensão de deputado assegurada, emite recibos verdes a órgãos de comunicação social, tem livros publicados que vendem, é possível que ensine em alguma universidade privada: não lhe faltam proveitosas fontes de rendimento. Sonhará PP com algum ministério?

sábado, 4 de novembro de 2006

O ícone das mulheres portuguesas hoje avós


Um homem fotogénico. E charmoso, que encantava as mulheres que com ele privaram e comunicaram. Não surpreende: uma inteligência superior, uma impressionante capacidade de trabalho; chefiava o Governo, era atencioso e elegante, escrevia e falava primorosamente. E os olhos, meninas e senhoras, que olhar o dele.

sexta-feira, 3 de novembro de 2006

Pessoas

Há pessoas que confundem simpatia com assédio: o que lhes falta em discernimento sobra-lhes em vaidade.

quinta-feira, 2 de novembro de 2006

Esperança aos 21

Às vezes converso com ilustres desconhecidas. Uma delas, menina de 21 anos, estudante de Literatura na Universidade Nova, acaba de me prendar com as seguintes delícias :

"Sou demasiado inteligente para ser de esquerda; não tenho por vício culpar o Estado pelos meus erros pessoais, não quero partilhar as minhas maçãs com ninguém."

Por ser brilhante merece o registo.

Legitimidade

Fátima Bonifácio, historiadora de imenso mérito, escreve hoje no Público que "a violação explícita de promessas eleitorais abala fatalmente a legitimidade para governar".
Impossível discordar, claro está. A pequena tragédia é que a violação e o incumprimento das promessas, a despudorada demagogia dos titulares do poder político, não são crimes ou sequer infracções. Nos Tribunais, é proibido mentir aos juízes e magistrados. Quem o faz arrisca-se a ser acusado de perjúrio. No Governo e no Parlamento mentir parece ser uma necessidade e um hábito, uma indelicadeza inócua, que se esquece ou se tenta dissimular. Não há quem destitua o senhor ministro por ostensivamente faltar à verdade, não há quem multe o senhor deputado por transformar suposições em factos. Enfim, tristemente, não há lei que contemple esta realidade social. E não há quem se indigne com existência de uma e com a ausência da outra.
Em tempos não muito distantes, houve outra compreensão ética da actividade política. Um dos seus mais ilustrados represententes escreveu que ela não podia ser "esse alarido de promessas sem consistência e de exigências sem seriedade, "esse borbulhar de ideias sem fundo e arquitectar de planos sem base, " esse correr sem brio atrás de uma notoriedade sem mérito",
"esse atear de paixões incontroláveis e doentia exploração dos piores sentimentos", "essa estranha equivalência da verdade e da mentira". Não devia ser mas tem sido e parece que continuará a ser.

quarta-feira, 1 de novembro de 2006

Orgia Scherzo em Fá

Um cheirinho de música portuguesa, da mais independente música que por cá se faz, da que não se ajoelha às conveniências comerciais, da que recusa compromissos que conspurcam a liberdade artística, da que não precisa e não quer participar do lixo televisivo.
Um cheirinho dos Mão Morta, que pouco portugueses seriam se não tivessem também cantado o amor.

Negra Flor

Olá Amor
Estranha flor
Tens o poder
Do meu sofrer
Do meu degredo
Doce amor
Negra Flor
Doce amor
Amarga Flor
A ti pertenço
Só em ti eu penso
Por ti me afundo
Adeus ò mundo
Estranho amor
Negra Flor
Doce amor
Amarga flor
Queres-me animal
Para tratares mal
Como um capricho
Deitado ao lixo
Doce amor
Negra Flor
Doce Amor
Amarga flor
Carícias garrotes
Abraços chicotes
Cálices de mel
Cheios de fel
Estranho amor
Negra Flor

Mão Morta, Vénus em Chamas, 1994

A Li foi para Timor

A Li é uma menina com 31 anos recheada de qualidades: é inteligente e instruída, é simpática e serena. Quem a conhece, não pode senão estimá-la e sentir-se bem na sua companhia. A Li tem condições técnicas para exercer a sua profissão em qualquer estabelecimento do ensino liceal/secundário. Queria ensinar, tentou ensinar, mas não conseguiu ser admitida: a Li é o exemplo vivo de um dos defeitos do sistema, aquele que admite medíocres e rejeita capazes. Como hay que buscar la vida, a Li tomou uma daquelas decisões complicadas e foi hoje, contratada pelo IPAD, para Timor, participar na formação dos futuros professores timorenses.
O Pictionary, a cerveja e os enchidos, a abundante palheta e a resistência a Morfeu, haviam mantido adormecida a ansiedade noite fora. No aeroporto, o inevitável sofrimento da separação: o Gabi que sabe que a provação reforçará ainda mais o seu admirável casamento, as eternas amigas Ni e Sandra que sabem a falta que vão sentir da Li. E eu, que observei, e que fiquei a pensar que a Li vai dar conta do recado e que vai ter muito para contar quando voltar.

Avô

Avô, querido avô, morreste já lá vão dois anos, mas continuas presente. Enquanto não faltar memória e o coração não se endurecer, continuarás entre nós, filhos, netos, sobrinhos, que sentimos a tua bondade e tua calma, que apreciámos e nos pasmámos com o teu imenso apego ao trabalho, que gozámos os resultados do teu poupar previdente, que aprendemos contigo como se pode conseguir uma família unida. Foste um homem memorável, avô.